Enquanto TRUMP não vem….

Este blog se manteve em silêncio nos últimos meses. Muita coisa aconteceu, mas foi sempre mais do mesmo do que vínhamos publicando aqui desde o início. Não quisemos ser por demais repetitivos. Desde o início deste blog falamos que o golpismo militar é uma doença crônica do Brasil, o que nos faz a maior república bananeira do planeta. Avisamos que um golpe seria tentado e alertamos para o risco de ações (para)militares terroristas. Para quem nos via como simplórios adeptos de teorias conspiratórias, o tempo nos deu razão.

Fracassada a intentona golpista, o que vimos nos últimos meses foram as FFAA golpistas negociando impunidade e manutenção do seu status quo até a próxima oportunidade de dar uma quartelada. Tudo com a mediação pública de um ministro fantoche, para evitar expor as fardas sujas e manchadas.

As revelações da PF sobre a investigação da intentona de 8 de janeiro, a partir dos áudios e vídeos deixados incólumes pela imprudência do ajudante de ordens da presidência, nos permitiu chegarmos a algumas conclusões:

1- A quase totalidade dos militares estava disposta a bancar um golpe. A  pressão do Departamento de Estado dos EUA, a quem prestam obediência, jogou um balde de água fria no projeto golpista. Parte majoritária do alto comando das FFAA avaliou que seria uma aventura com grande risco de fracassar. Muito a contragosto, porém obedientes e resignados, decidiram não levar a quartelada adiante. Porém um grupo de golpistas convictos não se submeteu às ordens superiores e seguiu agindo em paralelo. Outros assumiram uma posição cômoda, colaborando com os preparativos de sedição num estilo low-profile, torcendo pra dar certo, mas não se envolvendo abertamente, a fim de se preservarem em caso de fiasco.Se desse certo, estariam dentro; se desse errado, diriam cinicamente não ter nada a ver com isso (como de fato fizeram). Estes são os supostos “legalistas”, que não agiram para frear o golpismo. Deixaram os subalternos se articularem livremente, fizeram vista grossa, se omitiram vergonhosamente. Se o golpe vingasse, mesmo com vida curta em razão de seu isolamento internacional, os tais “legalistas” entrariam em cena como os pseudorestauradores da ordem democrática. Mas só após terem afastado do poder todos os adversários inconvenientes. Talvez este fosse até mesmo o Plano B dos golpistas, Fracassada a intentona, o alto comando agiu para abafar o caso e garantir a impunidade de seus pares, seus “irmãos por escolha”, no bom e velho corporativismo da caserna. Sempre com a velha e esfarrapada desculpa de preservar a instituição militar.

2 – O que não estava nos planos foi o descuido do ajudante de ordens da presidência, que permitiu a descoberta da trama e expôs os dissensos entre os generais e alto oficiais A revelação das conversas dos golpistas escancarou uma ferida grave no meio militar: o veneno da insubordinação. Chamar um “irmão” de “cagão”, foi além dos limites toleráveis. Sem respeito à hierarquia e à disciplina, a instituição militar desaba. E isso abriu uma brecha para a punição de alguns golpistas mais empedernidos. Agora os comandantes  já  aceitam a punição individual de alguns oficiais, que serão entregues à própria sorte. Afinal, alguém terá que pagar o pato. Que não se espere uma punição dura e abrangente. Mas alguma penalização haverá, o que não deixa de ser alguma coisa. Em troca, parece que foram muitas as negociações de bastidores para frear a execração pública dos militares: Comissão da verdade enterrada, nada de ordens do dia em 31 de março, nenhum ato oficial em defesa da democracia. E não perderão uma oportunidade de anistiar os envolvidos, em nome de uma “pacificação nacional”.

3 – Dessa forma, o “coração golpista” das instituições militares seguirá vivo, ainda que momentaneamente recolhido, na defensiva. Porém o golpismo continuará a ser uma sombra a nos ameaçar, com as academias militares despejando centenas de “golpistas do amanhã” a cada ano. A maior república das bananas do globo ganha tempo para a sanha golpista recuperar o seu fôlego.  A sociedade política demonstra ser incapaz, além  de covarde, para enfrentar a chantagem militar. E a sociedade civil, fragilizada, tampouco é capaz de reagir à altura. Nossa sina de permanecermos como a maior república das bananas do planeta segue intacta.

4 – O respeito à hierarquia, no caso a externa, a submissão ao comando militar do sul dos EUA, provocou uma cisão nas FFAA. E o golpe  só não ocorreu não pela intervenção de “legalistas” mas, como disse um golpista descaradamente, pela inação de generais “cagões”. É certo que, se tivesse sido implementado, a quartelada bananeira não teria vida longa. Mas provavelmente causaria prisões e assassinatos de autoridades e lideranças populares, com alto risco de derramamento de sangue pelas ruas, numa violência provavelmente terceirizada para os CACs. Esse era o projeto por trás da liberação desenfreada das armas e munições, que ninguém se engane quanto a isso.

5- Neste cenário, chega a ser patético e risível a atenção dada à decisão do STF que “esclarece” que o artigo 142 da Constituição não permite que os militares interfiram no poder civil. Tudo não passa de mais um ato do teatro de conciliação com a milicada golpista.Alguns poderão argumentar que esta decisão tem um significado simbólico e outros bla-bla-blás. Como se nas repúblicas bananeiras o ato de rasgar e pisotear a Constituição não fosse a primeira ação das quarteladas.

6 – Como o fascismo segue vivo e atuante, com alguns de seus líderes consagrados com votações expressivas, o risco de novas conspirações não está descartado. Que os órgãos de inteligência acompanhem de perto possíveis ações terroristas organizadas por oficiais militares ou paramilitares dos CACs. Aliás, um oficial tinha um verdadeiro paiol em casa, que explodiu acidentalmente. Não é difícil imaginar com que intenções ele mantinha esse armamento. E certamente existem  outros paióis espalhados pelo país. Prova disso é que outro “cidadão do bem”, defensor da família tradicional, após matar a amante foi descoberto com 80 armas e mais de 16 mil munições em casa. Que ninguém se iluda: esses episódios revelam apenas a ponta do iceberg.

7 – Enquanto isso, o Governo Lula segue sitiado e sabotado pela oposição, com sérias dificuldades de implementar mudanças que provoquem algum impacto relevante no cotidiano dos cidadãos brasileiros, seja no curto ou médio prazo. O Presidente, cujo carisma nos salvou da tragédia que seria a reeleição do inominável, vê a sua popularidade ser lentamente corroída.

8 – Uma provável vitória de Trump poderá ser o estopim de uma nova ofensiva golpista. Resta, pois, pouquíssimo tempo para desarmar as inúmeras minas espalhadas pelo caminho pelos fascistas nos quatro anos sob domínio do capetão.

Para finalizar

  • A intentona golpista recebeu o apelido de “golpe tabajara”. De fato, houve trapalhadas inacreditáveis. Mas sejamos francos: o golpe só não se consumou por detalhes. E a investigação da PF só revelou a trama por conta do descuido do Mauro Cid, que relaxou por estar muito seguro do sucesso da empreitada. O buraco em que estamos metidos, que nos condena ao republicanismo bananeiro, é muito mais profundo do que se supõe.
  •  A marionete da caserna que ocupa o cargo de Ministro da Defesa proferiu uma atrocidade: afirmou que os militares impediram o golpe de 2024. Se foram os artífices do golpe de 1964, estariam agora assim redimidos, com a história da ditadura militar podendo ser enterrada e esquecida. Triste papel para um Ministro de Estado.