BANANAS FOREVER? (1)

Como ocorre tradicionalmente no Brasil, parece que mais uma vez se fugirá do enfrentamento com os militares bananeiros. Uma punição simbólica aqui ou acolá, o sacrifício de alguns no triste papel de “bode expiatório”, nada de muito contundente. E ainda testemunharemos o sutil deboche da caserna, da impunidade grassando, a absolvição de golpistas com argumentos patéticos. Cereja do bolo, vemos até a nomeação de alguns conspiradores notórios para cargos relevantes na corporação. Claro que, em nome de uma pacificação transitória, teremos alguns discursos vigorosos de defesa da legalidade para enganar incautos.  Mas nada esconde o fato de que nossos militares foram e são golpistas.  Se os militares bananeiros não avançaram o sinal foi porque o Tio Sam mandou o recado: “- segurem seus impulsos por aí”.  Disciplinados que são diante de quem reconhecem como autoridade hierarquicamente superior, ainda que a contragosto, nossos “nacionalistas” fardados literalmente entubaram. Mas são golpistas congênitos e, talvez sonhando com o retorno do Trump, apenas esperam uma nova oportunidade para se pendurar nas tetas da viúva..

Nem com todo carisma, popularidade e habilidade política Lula será capaz de puni-los como deveriam. Tampouco nenhuma força política o fará. Só a sociedade civil organizada, mobilizada e atuante poderá empurrar este pretenso “poder moderador” para dentro dos quartéis e lá permanecer.

Portanto, para se livrar do destino de ser uma eterna república bananeira, o Brasil tem pela frente  um grande desafio. A tarefa mais imediata é empurrar o nazifascismo brasileiro de volta ao esgoto de onde saiu. Este é o primeiro passo para derrotá-lo, muito mais além da vitória eleitoral.

Antes de prosseguir, cabe uma uma observação. Nossos cientistas sociais, nossos acadêmicos, vão debater até o fim dos tempos da pertinência de se usar os conceitos de nazismo e fascismo para se referir ao atual momento histórico vivido pelo Brasil. Não que se trate de uma discussão bizantina (a discussão sobre o sexo dos anjos enquanto os Otomanos tomavam Constantinopla). A ciência, com seu rigor metodológico e conceitual, nos permite compreender melhor o mundo em que vivemos e nos capacitar para construir alternativas. No entanto, na ação política cotidiana, na esfera comunicacional, a urgência não nos permite certos pruridos conceituais. Umberto Eco sistematizou o que ele chamou de fascismo eterno (Ur-fascismo). São atos comunicativos comuns a todas as tendências políticas de extrema-direita ao longo da história contemporânea. Não necessariamente a-históricos, mas que ganham características peculiares em cada país em que se instalam.

O que nós enfrentamos é a forma como o nazifascismo contemporâneo se constituiu no Brasil, que é o legado deixado por Bolsonaro. Um nazifascismo que no passado emergiu sob o manto do Integralismo, que na atualidade tomou a forma dessa coisa abjeta que é o bolsonarismo. Não chega a ser algo novo, pois isto sempre existiu entre nós. E vai continuar existindo. Como escreveu Bertold Brecht na sua paródia do nazismo (A resistível ascensão de Arturo Ui), “a cadela do fascismo está sempre no cio”. O desafio civilizatório é mantê-la contida, impedindo-a de parir novos seres imundos.

Não temos pela frente uma tarefa fácil. Além da sombra da quartelada dos milicos bananeiros, há uma extrema direita barulhenta no Congresso, em torno da qual deve ser erguida um forte cordão sanitário. A ela se somam alguns governadores, a quase totalidade dos militares, um grande contingente de agentes públicos incrustados em todas as nossas instituições permanentes (de forma mais preocupante no sistema de justiça). E o pior: uma base social que reúne uma numerosa classe média ressentida, somada a um lumpesinato sem horizontes, milicianos, empresários do ogronegócio, neo-escravagistas, proto-assassinos torpes protegidos por CACs, estelionatários e toda sorte de criminosos comuns.  A ficha corrida dos detidos nos atos terroristas de 8 de janeiro nos deram um representativo retrato dessa turma.

Puni-los de forma exemplar pelos atentados contra o Estado Democrático de Direito, sem qualquer condescendência, seria imperativo. Mas o impulso para que façamos aqui algo parecido com o mostrado no filme “Argentina 1985” vai se esgotando rapidamente.

E o tempo é curto. Diríamos que somente até as eleições norte-americanas no final de 2024. Até lá contaremos com uma relativa complacência, um discreto apoio dos democratas do Tio Sam.  Somente porque eles estão sob a ameaça do retorno do trumpismo. O nosso projeto de um país soberano logo voltará a ser torpedeado. Lula tem habilidade suficiente para administrar essa relação, por enquanto. Depois, seja qual for o resultado da eleição norte-americana, voltaremos a ser sabotados. Repetimos, mesmo que para alguns pareça uma análise simplista: a posição dos EUA teve um peso decisivo para que os militares não colocassem as suas manguinhas de fora e dessem mais uma quartelada esdrúxula.

Estamos no meio de uma guerra comunicacional na qual os inimigos partiram na frente e fizeram um estrago imenso. Ao Governo cabem muitas responsabilidades, atitudes e políticas públicas para reverter o estrago feito. Mas sem o engajamento da sociedade civil, de forma organizada e autônoma, não derrotaremos o nazifascismo brazuca.

“Desnazificar” o Brasil não será tarefa fácil. Mas isso é assunto para uma próxima postagem.