“Tudo (quase tudo) como dantes no quartel de abrantes” na nossa República das Bananas.
Tivemos análises para todos os gostos acerca das eleições municipais. Até os derrotados usaram a famosa “teoria da pilha” em suas avaliações (sempre tem um lado positivo…). Porém, na essência, pouca coisa mudou na república bananeira. Conforme o entendimento deste blog, o que caracteriza uma república das bananas é um tripé formado por uma elite dominante de corte agrário-exportadora, instituições militares anacrônicas e uma classe política patrimonialista-paroquial. Analisando os resultados das urnas, vemos que essa hegemonia se manteve, com ligeiras variações.
O grande vencedor foi o patrimonialismo paroquial, impulsionado pela ampliação do controle do Congresso sobre orçamento via emendas PIX. Nada muito diferente do que sempre foi. Os velhos PMDB e PFL agora se diluem nas novas legendas fisiológicas do “Centrão” (PSD, União Brasil, Republicanos, etc).
A extrema-direita, o neofascismo, fincou o pé em 30% do eleitorado, além de ter vencido em cidades importantes com candidatos bizarros (Cuiabá é um exemplo). E colocou candidatos com desempenhos inacreditáveis no segundo turno, até mesmo em cidades que viveram tragédias por conta do negacionismo (Porto Alegre e Manaus). Uma nova e intrigante realidade que veio para ficar por um longo período.
Os partidos de esquerda poderiam comemorar um pequeno avanço numérico em número de vereadores e prefeituras. Só que tomou uma coça nas grandes cidades do país. Em Belo Horizonte, foi um fiasco histórico. Nas cidades maiores onde chegou ao segundo turno, ganhou apenas em Fortaleza, e por uma margem mínima. No simbólico ABC, perdeu em todas, salvando apenas Mauá. No “novo ABC”, Resende e arredores, lugar em que as novas montadoras estão se instalando, não foi eleito um vereador de esquerda sequer. Em Belém, o candidato à reeleição nem foi ao segundo turno, superado por um negacionista climático, logo na cidade que irá sediar a COP2025. Resta “comemorar” as vitórias das coligações “frente ampla”, que derrotaram os candidatos da extrema direita em algumas cidades grandes. Convenhamos, é pouco, muito pouco.
O mais preocupante, no entanto, é que vimos o fisiologismo e o neofascismo cacifarem muitos de seus nomes para a disputa do Senado em 2026. Se esse projeto for vitorioso, a governabilidade do próximo presidente ficará totalmente refém do que existe de pior na sociedade brasileira. Sem falar na ruína do sistema de “pesos e contrapesos”, caso o Senado tenha maioria para avançar na destituição de ministros do STF. Retrocessos gigantescos à vista. A vitória folgada de Trump, com o Elon Musk de cabo eleitoral, é um prenúncio de que poderemos voltar a viver situações dramáticas por aqui.
As candidaturas baseadas em “bandeiras identitárias” tiveram alguns avanços. Porém também demonstraram os limites deste tipo de estratégia política. Foram eleitos 231 dos 3.040 candidatos registrados no TSE como LGBTQIA+. Dos 27 trans eleitos num universo de 967 candidaturas, 19 foram eleitos por partidos de centro-direita e extrema-direita (PP, PL, União Brasil e Republicanos).
Houve um ligeiro aumento entre as mulheres eleitas vereadoras e prefeitas, que ocuparão cerca de 17% destes cargos eletivos. Só que 80% delas também por partidos de centro-direita ou extrema direita.
Cerca de 53% dos candidatos se declararam ao TSE como pretas ou pardas (56% da população do país segundo o IBGE), porém somam apenas 1/3 dos candidatos eleitos. A preferência partidária seguiu o mesmo padrão conservador dos demais grupos.
Ou seja, fascismo pode obter hegemonia política nas representações de LGBTQIS+, mulheres e negros, por mais esquizofênico que isso possa parecer.
A articulação de movimentos sociais, com as iniciativas recentes de construir redes de apoio para algumas candidaturas, experimentou algum avanço. O MST elegeu 133 vereadores em 19 estados, dos quais 43 são militantes do próprio movimento. A articulação “Vote pelo Clima”, que começou nas eleições de 2020, elegeu 135 candidatos em 78 cidades brasileiras. E algumas dezenas de prefeitos e vereadores indígenas e quilombolas foram eleitos em pequenos municípios. Pode não ser muita coisa, mas é uma senda a ser mais e melhor explorada. Num universo de 58 mil vereadores e 5.600 municípios, ainda há muito espaço para avançar..
Por outro lado, centenas de líderes religiosos fundamentalistas e de militares de todas as forças conquistaram mandatos em todo o país. E tivemos ainda a novidade dos coaches– influencers e dezenas de médicos cloroquiners. E dúzias de prefeitos e vereadores armamentistas e/ou negacionistas climáticos.
Porém teve algo de muito mais grave e temeroso nesta eleição: a consolidação do crime organizado nas disputas. Depois das milícias, o tráfico também entrou no jogo político e elegeu candidatos. Dinheiro sujo financiando campanhas, controle territorial de feudos eleitorais controlados pelo crime, coação de eleitores, assassinato de adversários e outras formas de violência política. Só em São Paulo foram 70 candidatos, sendo eleitos 10 vereadores e 2 prefeitos, segundo informações repassadas pelos órgãos de inteligência ao TRE. Em outros estados ocorreram fatos similares, com candidatos e eleitos com mandato de prisão em aberto, indicando que as leis em vigor têm sido pouco eficazes para impugnar candidaturas de criminosos.
Enfim, as perspectivas continuam sombrias para a maior república bananeira do mundo. Aproveitemos a pausa que ganhamos para respirar e que não sabemos até quando vai durar. Há que se buscar alternativas, e urgentemente.